O Comandante Guélas
Série Paço de Arcos
Futebol P.A. 4
Futebol P.A. 4
A tradição já não é o que era, a
vitória já não chegava a quem se regia pelas leis, mas sim a quem ditava as
leis, a quem as impunha aos seus adversários. Na bolsa de jogadores quem aposta
no Fininho ganha sempre, por isso o Brinca na Areia já não é o seguro de vida
para a vitória, e tudo isto desde o “Caso Lagoas Parque”, quando o suspeito
trouxe o Sete Escadas, o veículo da golpada, um jogador descendente dos
tripulantes da nave do “Caso Roswell”, segundo teoria do jornalista Bill, que
causou danos existenciais em todos os atletas. A sua influência põe em risco a
harmonia destes quarenta gloriosos anos, enchendo de vergonha os seus ancestrais,
o Choné e o Miguel CG, que dão agora os primeiros passos na arte do Bocia
paçoarcoense, antevendo um futuro glorioso no campo do lado. Será agora mais
sensato escolher, logo após a saída da pedra, um velho com mais de meio século,
que antes vinha no fim por exclusão de partes, a um “tenrinho”, classificação
da tabela do “Capitão Porão” que ainda se mantem em vigor, assim como a mão na
grande área significa livre indirecto fora dela. Este domingo solarengo esteve
a favor do Fininho, a hora mudara, mas ninguém sabia em que estado viria o
relógio dele? Marcaria um golo e daria por finda a partida, alegando falta de
visibilidade como era prática antiga, ou aceitaria a lei, e a hora seria a
oficial? Quando o pai e o filho marinheiros apareceram com chuteiras amarelas,
uma bola de berlinde como esférico oficial e luvas estilo barbatanas para o
guarda redes, o Bill, jornalista dos angolanos, com pouco faro para o jogo, mas
muita intuição para as notícias, desconfiou, o colega da TVI, o único jogador
que mantinha o penteado do princípio ao fim, sinal de que não usava a cabeça
para nada, típico dos atletas da família, preparava-se para prometer uma
entrevista exclusiva ao Pedro Dias no final da partida, e por isso a gestora
espanhola, que não percebia nada de números, oferecera-lhe a ele e ao pai umas
faluas cor de canário. A tradição mantinha-se, o Milhas mandou vir com o Peidão
por causa da equipa:
- És sempre enganado, eles só têm
dois velhos, o Fininho e o Marinheiro pai, o resto é só malta nova!
Ficavam de fora da contagem do
jogador mais complicado de todos os tempos os adolescentes Laranja e To Zé! Após
os primeiros vinte minutos de jogo já todos sabiam que a vitória não iria fugir
à equipa adversária do Fininho. Puro engano! A uma dada altura da partida
deu-se o incidente habitual, que faz sempre mudar o destino do encontro, mais
uma vez protagonizado entre o senhor todo poderoso do Lagoas Parque e o infeliz
do árabe, que na semana anterior tinha sido atirado de pantanas pelo ar. O
marcador anunciava um resultado de 4 a 6 quando o Fininho se atirou de encontro
ao Milhas, mas este protegeu-se miraculosamente, atirando com ele de encontro a
uma parte macia do campo.
- Blasfémia, blasfémia, - gritaram os
seus jogadores, exigindo um penalti duplo.
O Fininho tinha sido atirado para
longe e jazia no chão com um ombro inconsciente. Durante algum tempo
pareceu-lhe ouvir o barulho da carroça do senhor Bazílio a sair da carvoaria na
Avenida, para mais uma distribuição de carvão pela zona. Abriu os olhos e
viu-se rodeado da Amélia, da Terrugem de Cima, e das suas seis filhas, a
Isabel, a Maria de Lourdes, a Rosalina, a Graça, a Arminda e a Maria Adelina,
que lhe diziam:
-Acorda Fininho, estás a perder,
precisas de repor a verdade do jogo!
Ao Peidão tinha-lhe saído a pedra,
mas mesmo assim jogou a maior parte da partida com menos um jogador, sinal de
que aqui também havia mão do Fininho, especialista em rapto de jogadores. A
verdade do jogo só foi reposta quando o pai Marinheiro fez “auto-falta” e
lesionou-se, sendo obrigado a recolher ao banco. As equipas estavam finalmente
com o mesmo número de jogadores. Quando o Fininho ressuscitou, todos esperavam
pela pesada sanção, mas surpreendeu os presentes com um veredito invulgar:
- Não foi falta! – Disse, piscando o
olho ao Bill.
Não foi falta, mas foi golo cinco
minutos depois, após um alívio suspeito do amigo dos angolanos: 5 a 6 no
placar! Mas os festejos duraram pouco, um contra ataque da equipa mais poderosa,
em que o apelo desesperado do adolescente Laranja a um companheiro, “vai com
ele, vai com ele”, e apontou para o Espalha, fez com que todos corressem na direcção
do sobrinho da Uber, abandonando o portador da bola, que se limitou a chutar o
esférico para o fundo da baliza. Durante toda esta dinâmica futebolista o jornalista
da TVI esteve mais preocupado em manter o penteado intacto para a chefe Judite.
Durante a ausência do maestro, até o pacato To Zé simulou uma falta grave na
grande área, acusando o mártir Milhas de uma agressão violenta, parando o jogo
e evitando um golo iminente do referido árabe, que enrolou a língua nas cordas
vocais e repetiu a frase de protesto várias vezes, acabando por isso de ganhar
mais uma alcunha: Papagaio! E antes de dar por terminado mais um relato dos
vergonhosos acontecimentos, o Chico Paulo demonstrou, mais uma vez, estar do
lado dos inimigos ao permitir dois frangos monumentais que deram a vitória ao
Firmourinho. Como prémio de consolação regista-se o monumental golo familiar
protagonizado por dois soberbos jogadores, o Zé Miguel e o Peidão que, após o
grito de guerra “passa a bola ao papá”, o veterano enfiou o berlinde dentro da
baliza adversária com o pé esquerdo. Espera-se que no próximo encontro a
verdade do jogo seja reposta, como é apanágio de um Estado de Direito
Democrático!
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