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315 estórias

Tuesday, September 04, 2012

Instrução Militar


Comandante Guélas

Série Colégio Militar

Estávamos no ano letivo 1972/1973 e a turma E do segundo ano preparava-se para iniciar a aula de Instrução Militar (mais conhecida por INFIA). O jovem tenente fazia a chamada e ia ouvindo gritos alternados de “presente”, ao estilo inconfundível de militares . Até que:
- Aluno 601!
- Presunto.
Risota geral! Houve uma pausa, uma breve pausa na rotina, até que o oficial investiu raivoso sobre o prevaricador que tinha ousado parodiar com a instituição militar, e deu-lhe um soberbo carolo, que o fez soltar um grito estridente de morte. Seguiu-se a apresentação do evento, iriam ser divididos em três grupos, as três filas da formação, que seriam comandadas por alunos a designar, tendo como missão deslocarem-se para um canto da parada, onde fariam o manuseamento das Manelican à ordem do chefe do momento. Ao prevaricador Gordini (601) foi entregue o comando da terceira fila e indicado o local para onde se deviam deslocar: o canto esquerdo da parada!  Até ao local o aprumo foi exemplar, o modelo seguido era o colega 69 (“o número mais vergonhoso do colégio” – Horrível ), Manelican no ombro esquerdo, braço direito a subir até à altura do ombro, barulho dos calcanhares a bater no solo, só destoava a voz fininha do líder, mas depois de um carolo daqueles não se podia pedir mais. Mas não pararam no sítio indicado, dobraram a esquina, e uma vez dobrada as instruções foram outras, “destroçar” foi a ordem, mas foi um “destroçar” organizado, que obrigou a uma escala na vigilância. Os movimentos do tenente deveriam estar controlados, não se podia arriscar. O 125 (Horrível) sentou-se no chão e puxou de um cigarro, ao mesmo tempo que contava as aventuras amorosas do fim-de-semana, não fosse ele um dos mais precoces, ou imaginativos, do batalhão colegial. Os outros optaram por fazer um despique de petardos, parecia o foguetório de uma festa de verão. Ao longe as outras duas filas trabalhavam que nem formigas, “firme”, “sentido”, “ombro arma”, “apresentar arma”, “ombro arma”, “descansar arma”, “à vontade”, num movimento automático que até cansava os pupilos do aluno Gordini (601), que ressonavam no passeio, junto à porta lateral da quarta companhia. De repente o 191 (Peidão), que estava de vigia, gritou:
- O Cuequinha vem aí!
Ao longe via-se o tenente a acelerar o passo não acreditando no que via, mais precisamente no que não via, a terceira fila do 2º E. Quando dobrou a esquina deparou-se com uma formatura impecável, em “apresentação de arma”, um miminho para o oficial, cujas Manelican estavam todas apoiadas com o cão nos cintos de cabedal, para assim aliviarem os braços dos meninos. Mesmo assim o Cuequinha quis saber a razão para a escolha daquele local, tendo o fator “sombra” sido a justificação. Deu então ordem para se deslocarem para a ponta oposta, local mais próximo dos colegas, e assim sucedeu, braço à altura do ombro, calcanhares a castigar o alcatrão, e a mesma voz esganiçada do líder, sinal de que ainda não passara o efeito inebriante do fabuloso carolo do Cuequinha. Mas a cena repetiu-se, a terceira fila do 2º E tornou a dobrar a esquina e “destroçou”, desta vez junto à porta lateral de acesso à terceira Companhia. O recreio durou pouco, o oficial estava atento! Foram salvos por uma inesperada chuva torrencial, que alterou o plano da aula:
- Formar, - gritou o tenente, quando todos se preparavam para uma debandada geral.
Seguiu-se a ordem de “passo de corrida em frente marche” até à sala de armas, lá para os lados dos claustros. Se fosse nos tempos que correm o facto era notícia da primeira página do “Correio da manhã”, que diria que os alunos se tinham constipado por terem ficado com as cuequinhas molhadas, mas felizmente tudo tinha decorrido nos anos setenta do século anterior, em que as cuequinhas ficavam molhadas, não pela chuva, mas pelas aparições espontâneas da mítica Rosa. E não consta que ninguém tenha ficado constipado por marchar debaixo de uma carga de água torrencial. 

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