O Comandante Guélas
Série Paço de Arcos
Numa noite de Verão o Gang resolveu
ir inaugurar um novo espaço de diversão, a piscina do Serapito. O local
cheirava a novo e as mudanças da numerosa família estavam para breve, ou seja,
o espaço ainda se encontrava vulnerável. A água azulinha convidava a uns
mergulhinhos, mas os turistas não vinham preparados para o evento e por isso
tiveram de improvisar. Foram todos nus. Todos?! Todos não, o mano mais velho do
Citron foi o primeiro a inaugurar as instalações. Caiu no erro de ir espreitar
para o fundo da piscina sendo de imediato arremessado lá para dentro. Ficou
furioso, dizia que tinha avisado que estava na digestão, talvez da cerveja, mas
foi de imediato confrontado com a dura realidade: se tivesse de lhe acontecer
algo não era por estar aos berros à procura de um culpado que faria o tempo
voltar para trás:
- Paciência, também já viveste
muito, - sossegou-o o amigo Pontas.
- É melhor morreres de congestão do
que cortado ao meio pelo rápido de Lisboa, como aconteceu com o primo
surdo-mudo do João da Quinta, - reforçou o Peidão, outro amigo de longa data.
A festa estava animada, havia
“bombas” por todos os lados e montes de terra e palha a alterar o outrora
paraíso azul. Até já o “condenado à morte” participava nos saltos, mas todo
vestido por causa da digestão. Havia mais água fora do que dentro, a relva
acabada de plantar fora engolida pela lama, havia pegadas por todo o chão
branco imaculado e os adolescentes carregadinhos de cerveja vertiam águas
constantemente, tendo o cuidado de o fazer para dentro dos vasos. A quantidade
de cevada descarregada iria com toda a certeza alterar o código genético das futuras
rosa vermelhas que, com o choque, passariam para amarelo escuro. Por volta das
três da manhã o João Pestana veio buscar os meninos rabinos, chegando muitos
deles a casa sem acessórios. No dia seguinte o pai do Serapito, proprietário do
espaço privado, teve um ataque de caspa. A piscina parecia mais o lago dos
patos da Avenida, havia um cheiro intenso a mijo, e do rijo, e o limoeiro
resolvera produzir cuecas, uma delas com marcas profundas, sinal de que o
Bajoulo também participara na festa. No chão algo brilhou, era um relógio, a
única prova decente. Lembrou-se que tinha deixado um dos filhos a guardar a
casa, o mais corajoso, e acordou-o. Confrontou-o com a situação e teve de
agarrá-lo de imediato, porque ele ameaçou descer as escadas e matar os prevaricadores.
- Calma filho, já não está lá
ninguém.
Mostrou-lhe o que tinha descoberto
no chão e o ele provou ao pai que o único mano capaz de ter amigos com cebolas
daquelas era o Serapito. Foi de imediato à outra casa confrontar o outro filho
com o achado e depois de ele ter feito um checklist
mental das manias do gang a que pertencia, chegou à conclusão de que só um
é que poderia gastar tão pouco na comprar de um relógio:
- O Peidão, esse relógio só pode ser
do Peidão e com toda a certeza que virá buscá-lo.
- Peidão?! Então o menino tem amigos
com esse nome?! Não foi essa a educação que lhe dei. Vou reforçar-lhe as idas à
missa.
Nesse dia foi abordado pelo suspeito
que queria o relógio de volta e estava decidido a ir pedi-lo ao proprietário.
Foi um encontro cordial, o jovem afinal não era um pecador, prometeu não
participar em mais invasões, aliás não seria mais necessário pois o pai do
Serapito tinha-lhe posto o espaço à sua disposição. Reparou que o estranho nome
daquele amigo do filho não condizia com a figura angelical que lhe pedira
perdão pelo acto anti-social dos seus amigos que ele, como Menino da Luz,
tentara evitar mas fora impotente perante a turba de selvagens que lhe tinham
passado por cima e arrancado o relógio de pulso.
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