Comandante Guélas
Série Colégio Militar
O Colégio Militar sempre foi, ao
longo da sua história, alvo de invejas e tentativas de interferência. No Estado
Novo alguns responsáveis políticos e militares tentaram pôr os Meninos da Luz a
cantar o hino da Mocidade Portuguesa e a marcharem ao estilo dos Patos Marrecos.
Em vez disso cantaram, numa cerimónia oficial, e à revelia das ordens
recebidas, a Portuguesa, e quando lhes ordenaram “em frente marche” uns deram
um passo para o lado esquerdo, e outros para o lado direito, criando o caos.
Houve punições, e em resposta a elas levantamentos de rancho. O Poder Político
apercebeu-se que não iria ganhar a guerra e recuou nas suas intenções. Esta estória tem como cenário os tempos da balda, o Ano Letivo de 1974/1975,
e como protagonista o 75, uma espécie de latifundiário, com o bolso da camisa
sempre recheado de tabaco. Os colegas, o povo faminto de vícios, aliviavam-no
assim constantemente do peso dos cigarros sempre que havia aula de ginástica.
Mas um dia atrás do maço veio uma carta de amor. De início os vestígios do
Antigo Regime sobrepuseram-se aos novos ventos da revolução, mas rapidamente o
impasse moral foi ultrapassado por uma decisão de uma reunião geral de alunos,
o equivalente às providências cautelares dos tempos que correm, e o seu
conteúdo foi tornado público. A carta tinha sido enviada por uma tal de
Margarida, mas o anjo branco que ainda estava no ombro direito da maioria fez
com que regressasse ao bolso do proprietário. No estudo da noite algo chamou a
atenção do 7º A, o 75, contra tudo o que era habitual, estava a escrever
furiosamente. Furtivamente o 78 e o 85 aproximaram-se do Romeu e
depararam-se com um papel amaricado, cheio de corações. Estaria o camarada com
uma bichanite, “doença” intolerada num espaço em que o hino dizia que o “ardor”
só poderia ser “guerreiro”. Retiraram-lhe a folha, deram início a uma nova reunião
plenária, que decidiu qual o tratamento adequado para a cura:
- A carta de resposta vai ser
escrita pelos camaradas Maná e Preto!
Mas antes disso quiseram saber
qual o envolvimento do 75 com a tal Margarida, tendo sido informados pelo
paciente de que tudo não tinha ainda passado da fase da mão.
- Vamos preparar-te a cama, terás
direito a música, velas, comida e Champanhe, mas desta vez a almofada irá ser substituída
pela miúda, - informou o 78.
No dia do Chá Dançante o barracão
do Carioca foi decorado para a ocasião, e o espumante desviado da sala dos
oficiais. Fizeram paredes com as cadeiras, para dar a intimidade de um quarto,
e para esconder os observadores. Deram instruções de procedimento ao 75, que teria de
sair do espaço de diversão pela janela mais afastada do oficial de dia,
acompanhado pela Margarida, seguir um trajeto de segurança, que os obrigava a
passar pelo Ginásio, para dar tempo a que o público se acomodasse nos bastidores, munidos de máquinas fotográficas e de
filmar. Tudo decorria dentro do previsto, a entrada dos pombinhos no espaço
dedicado ao vício não levantou suspeitas, mas a relação, que se pretendia
tempestuosa, não passou do nível da língua, pois a Margarida, futura jornalista
da televisão, revelou-se uma gralha compulsiva, o que levou ao desespero a
assistência, e à intervenção de um deles:
- Ernesto, já provaste a miúda?
- Não, ela não se cala!
- Tens um minuto para o fazer,
senão fazemos nós.
A diva fugiu de imediato, e o 75
regressou à almofada.
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