Comandante Guélas
Série Colégio Militar
Amigo Escalope, permite-me que cite o padre António Vieira no
início desta humilde carta: “As outras histórias contam as coisas passadas, esta
promete dizer as que estão por vir”.
Caro aluno 307, do Ano da Graça de Nosso
Senhor Jesus Cristo de mil novecentos e setenta e um. Foi com muito agrado que recebi a
tua carta natalícia manifestando grande preocupação pelo futuro do Colégio
Militar, escola que eu criei com muito orgulho, e que tenho acompanhado desde a
fundação no átrio da entrada, mesmo estando pela metade. A santa, que está por
cima e que vocês se fartaram de apalpá-la, deixando-me orgulhoso da vossa
destreza física, vê mais longe e mantem-me informado. Uns continuam a
saudar-me, mas a maioria nem me liga, sinal dos tempos! As mães agora dizem que
os meninos estão sujeitos a apanharem uma tendinite devido aos gestos de
repetição a que a continência obriga. Sintoma de que a maioria dos meus
sucessores estão mais preocupados com as suas estrelas do que com o futuro dos
Meninos da Luz. Mas os antigos saúdam-me sempre! O colégio nasceu, disse muito bem o 92, do
Ano da Graça de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil novecentos e trinta
e quatro, na mesma altura em que
os franceses invadiam o país, e os governantes fugiam com o rabinho entre as
pernas, deixando no reino um exército miserável, fruto de uma política de
defesa negligente, pois tinham preferido gastar o dinheiro em obras faraónicas
inúteis, tal como agora no Ano da Graça de Nosso Senhor Jesus Cristo
de dois mil e treze. Gastámos
depois muito mais dinheiro no aluguer do Exército Inglês, que nos obrigou a
vender os anéis , e a dar o que restava aos invasores, mas cumpriu o papel que
deveria ter sido nosso: a defesa da pátria portuguesa.
Camarada Escalope, estás apreensivo com a vinda das Meninas com a Cruz
de Avis ao peito para o espaço dos Meninos da Luz? Então não foi na tua geração
que se atingiu o auge na demanda do túnel que finalmente iria pôr à disposição
de ambos uns e outros? Durante várias semanas muitos dos teus camaradas cavaram
feito loucos o que julgaram ser a entrada escondida para o Paraíso, deixando no
local vestígios biológicos, não aqueles de quem a maioria está a pensar, mas
sim partes de unhas, que continuam no
local como testemunhos desta geração que deu muito ao colégio, e irá dar
agora em mais um momento difícil. Relembro-te alguns dos heróis que nunca
desistiram da causa, mesmo quando foram corridos à paulada pelo Moca e pelo
Meia-Lua: o Pitosga (485), o Horrível (125), o
Peidão (191), o Cabedo (124), o Loira
(667), o Gordini (601), o Six (607), o Becas (157), o Xoxo
(652), o Bétis (653), o Barrada (664), e tantos outros que “qualquer alma
farão segura e forte”, valor este transmitido pelo Ferrari. Imagina-os se tivessem a combater um inimigo! Agora que elas caiem de paraquedas têm medo? Todos juntos
poderão vir ainda a ser muitíssimo melhores! Um colégio não é apenas aquilo que
é, mas também o que parece aos olhos dos outros. Poderás sempre dizer que em
França nenhuma secretária de estado com problemas existenciais íntimos ousará
tocar na Maison d’Education de la Légion d’Honneur, uma escola feminina pública
em regime de internato, fundada em 1811, e que funciona num mosteiro medieval
dedicado a São Dinis. Na minha época andámos em constantes mudanças,
ultrapassei todos os obstáculos, tal como o vosso 591 (Peixinho) os cavaletes
nas aulas de equitação, ao contrário na sela. O Colégio Militar manteve-se “firme
e hirto como uma barra de ferro”, palavras de um hipnotizador do vosso tempo chamado
Professor Alexandrino, o equivalente no palco ao Professor Comandante-chefe das
Forças Armadas, a quem um dia alguém teve a infeliz ideia de atribuir-lhe um
número, 695. Ambos sabemos que o artista que tomou esta decisão estava
unicamente a pensar na sua promoção, do que na hipotética defesa do Colégio
Militar por parte do senhor Silva. Nem do colégio nem do país, pois digo-te que
se algo de semelhante aos acontecimentos do início do século XIX se repetir,
será o primeiro a dar corda aos sapatos, tal como fez na altura o rei.
Camarada
Escalope, talvez a vinda das Meninas com a Cruz de Avis ao peito sejam os
reforços de que o Colégio Militar precisa, uma espécie de “ato falhado” do
Alguidar & Pandilha, um gangue que
já fez tanto mal ao país, obcecado por adolescentes e apoiado por jornalistas
com a mesma tara. Isto de misturar vícios com decisões políticas nunca deu
frutos no passado. Espero por ti no próximo almoço de curso, e estou desejoso
de ouvir novamente o vosso 69 (Fernandinho), um COMANDANTE com letra grande, a
berrar o Zacatrás, que me abanou os ossos, pois ele é um dos poucos que o faz
com alma e coração. E diz ao Bina (19), o herdeiro do vosso Semita, um pilar
fundamental da educação que recebestes, que dê o grito de guerra:
- Moçooos…neste
país uns políticos dormem de olhos fechados, outros de olhos abertos!
Camarada Escalope, o vosso
trabalho é descobrir o que está disponível, talvez os vossos vestígios biológicos, e o que pode
ser feito em nome do colégio com tão preciosas relíquias. Todas as expectativas
estão sobre vós, e a sensação que tenho na base do busto é que há muito para
fazer. Têm de mostrar que podem cumprir os objectivos num curto espaço de
tempo, caso contrário haverá desmobilização. Obriguem os putos a engolir as
vossas unhas, pois o código genético que elas contêm com certeza que os irão
pôr a marchar do nascer até ao pôr-do-Sol, como na vossa altura, com os
resultados sobejamente conhecidos e aprovados por mim. A crise do meu, nosso,
Colégio Militar, abriu as imaginações às catástrofes e às distopias.
Caro 307, “contra os canhões
marchar, marchar” ! Ponham, sem medo, os putos e as mães a marchar a semana
toda, e o futuro será de esperança.
E para terminar, Camarada Escalope, têm de
rever a placa do vosso curso, ela deverá destacar-se, e não confundir-se com o
estuque da parede, pintado com a tinta do Patronilha, que dava muito jeito nas
pinturas!
Um abraço
fraterno deste Marechal que vos estima muito
António
Teixeira Rebelo
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