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315 estórias

Monday, January 20, 2014

Odores Colegiais



Comandante Guélas

Série Colégio Militar

O Colégio Militar era um reino fugaz de odores. Por isso esta estória vai-nos conduzir de odor em odor, inebriando-nos, numa alquímica busca das raízes mais profundas deste espaço único.
- Ó ordenança, o meu cavalo já está arreado? – Perguntou o Galo, professor de Geografia, da janela do último andar dos claustros.
- Eu montava era as tuas filhas! – Disse entre os dentes o Esperma, fã incondicional das meninas do ten-Coronel de Cavalaria, que costumavam ir montar ao Colégio Militar com o papá.
Nestas alturas uma massa compacta de Meninos da Luz desaçaimados costumava assistir ao desempenho das três galitas, assentando arraiais no campo de futebol de 11, onde cacarejavam em uníssono, ao mesmo tempo que tentavam sentir o cheiro das donzelas, odor esse que guardavam religiosamente para mais tarde quando estivessem na solidão da cama. Mas geralmente o cheiro dos equinos levava a melhor sobre o da maresia, e não consta que tivesse alguma influência na líbido da rapaziada. O primeiro cheiro que o Cuecas de Buda deixou no local foi quando o 617 lhe tirou a barretina com as duas mãos e com uma joelhada na parte de trás fez-lhe uma amolgadela, seguido de um murro que pôs tudo no lugar. Com o susto, o rata teve uma ventosidade anal que deixou rasto nas cuecas, e metano no ar.
- Já está selada, - informou o graduado.
Mas depressa o odor do 45 foi abafado pelo bafo das axilas do Sovaco, sinal de mais um treino da Classe Especial de Ginástica, os já famosos “Gafanhotos”:
- O Dario é o Einstein da ginástica, consegue transformar merda em matéria, - disse um dia o professor Reis Pinto.
O Colégio Militar era um local especial onde tudo podia acontecer, até alguém trazer de uma visita de estudo às grutas de Santo António uma soberba estalagmite, fruto de um pingar minucioso com milhares de anos, ou deixar uma das caveiras da Capela dos Ossos com um dente pintado e um cigarro na boca. Continuemos. Um bom indicador para caracterizar o tipo de cheiros eram as alcunhas. O Peidocueca não deixava dúvidas sobre o tipo de odor que produzia, e também onde ficavam depositados os resíduos que vinham associados à movimentação de ar vinda do seu interior profundo.
- Abaixo a poluição, - gritou um dia o Horrível num tempo de estudo dirigido pelo professor de inglês, o Didi, exibindo uma meia preta do Escalope, já com quatro dias de uso, e à espera da muda semanal, que haveria de chegar no saco de pano aos quadradinhos azuis e brancos onde as roupeiras colocavam a roupa lavada, o toalhão turco, o sabonete e o champô “Gardirium”, vendidos pelo senhor Manel.
A aula de música decorria muitas vezes ao ritmo dos tiros de carabina no Páteo da Infia, cujas balas batiam com violência nas paredes.
- Ainda vou ser morto à traição com um tiro nas costas, - desabafou um dia o Carioca, afastando-se do alvo.
- E não se perdia nada, - retorquiu o Boca de Merda.
- Porra, tu tens um anãozinho morto entre os dentes, - desabafou o Peida Gorda, apertando o nariz.
- Ou então engoliste uma meia do Doninha, - exclamou o Pivea.
A reacção ao hálito do colega obrigou o professor de música a tomar as medidas habituais, um chapadão a cada um e uma ordem de expulsão, que era sempre do agrado da rapaziada. Cruzaram-se com o funcionário Miranda:
- Bom dia meninos!
Mas atrás dele vinha o capitão Peidinhas, senhor de um cú de preta, que quis saber a razão da saída dos alunos a meio da aula. A indisposição de um deles obrigara ao apoio dos camaradas, por isso iam diretos à Falca ao encontro do enfermeiro Valentim, que iria com toda a certeza receitar Sais de Frutos à vítima.
- Capitão, a rapaziada está a portar-se mal? – Interrompeu o coronel Bufalo Bill, de cabelo branco e bigode preto, pai dum 433, o Javali.
O oficial ensinava Geografia e era irmão de outro docente, mais alto, responsável pelo Desenho e Geometria descritiva, o Alcatrão. O grupo aproveitou a distracção e acelerou para a Enfermaria, cujo cheiro a éter os acalmou mal abriram a porta. Permaneceram pouco tempo, correndo depois para as companhias, tendo o 224 indo-se deitar na cama, mantendo a sua habitual atividade de tempos mortos: construção de estalactites expetorantes!

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