Comandante Guélas
Série Colégio Militar
A mocada não é apenas a nossa identidade passada, é muito mais do que isso, é também um conjunto de valores que nos importa prosseguir para o nosso futuro coletivo. A mocada representava a força da juventude e da ousadia daqueles que lutavam por um ideal, que não sabiam qual era.
O toque da alvorada ecoou pelas quatro companhias, e o 8 (Preto)
apercebeu-se que estava com a moca anormalmente rija. Mas não era só a dele! A
do 260 (Pesera) igualara a dureza dum pau, o 4 (À Nora) nunca imaginara que a
sua alguma vez se transformasse num ferro, o 274 (Balde) tentou passar
despercebido, mas não havia sítio onde esconde-la. A epidemia de mocas rijas
atingira todos os graduados e sucessores, parecia que a mítica Rosa dos anos
70, filha do senhor Nunes do trator, o responsável pelo curral e o aviário,
tinha feito uma visita de cortesia aos sonhos de todos estes adolescentes
desaçaimados, e bafejado as suas toalhas. Na noite anterior tinham estado atarefados a molha-las,
torce-las, alguns a enseba-las, e por fim a dobra-las e a atá-las, ficando
depois penduradas nos armários a secarem. Como verdadeiros patriotas,
preparavam-se para as comemorações do Dia da Independência, era o tempo da tradicional
Mocada, onde os Portugueses e os Espanhóis se iriam defrontar em duas arenas,
primeiro nos claustros, em que os alunos do 11º ano de 1995 estariam no papel
dos inimigos, os graduados do 12º ano no papel dos valentes lusitanos, e a
arraia miúda a assistir no primeiro andar. Os castelhanos atiçaram a raiva do
adversário com um discurso provocador, parecido com o do 73 de 1983:
“Vocês não valem nada (grito)
Está à nossa frente gente ”acubardada”
Vão levar na tromba logo à 4a badalada
Não vão sair daqui vivos depois desta Mocada”
Está à nossa frente gente ”acubardada”
Vão levar na tromba logo à 4a badalada
Não vão sair daqui vivos depois desta Mocada”
Esta última frase era premonitória! A assistir à Mocada esteve um dia o Ossos, o esqueleto de Biologia, com uma
tabuleta que dizia “1 hora com o Secas”, uma sentida homenagem ao ten-coronel
Estorninho, Comandante do Corpo de Alunos nos finais dos anos setenta, altura
em que teve nas mãos a missão da sua vida: libertar o Colégio Militar da balda
instalada pelo 25 de Abril de 1974, e fazê-lo regressar aos tempos áureos do
antigamente. Com
ele uma repreensão clássica de 2 minutos tornava-se
numa dissertação revolucionária de 20 minutos, ou seja, tinha trocado o
tradicional “pacote de estaladas em
sentido”, pela abrilesca “seca pedagógica”! A assistir à última Mocada digna de
registo, numa homenagem sentida a todos os antepassados colegiais, sentia-se a
presença duma espécie de Classe Especial do Corpo Docente, não os saudosos
“Gafanhotos” do Professor Dario, mas sim os “Joaninhas” da pedagogia, liderados
por aquele de quem todos ainda falam: Semita (professor Grijó)! Na ala oposta
estavam os “Bichos-de-Conta”, os funcionários, liderados pelo lendário Moca.
- Ó moçoooos,
ou batem bem ó levam todos uma bengala para casa (7 valores), - gritou o
Semita, ao mesmo tempo que avançava uma peça no jogo de xadrez que estava a
disputar com o oficial de dia.
Um barulho dum
copo a partir-se ecoou pelo espaço mais nobre do Colégio Militar, seguido dum
grito de guerra colegial, “Pê Jê” (“Paga Já”), que obrigou o Zé Pereira a sair
a correr dos “Bichos-de-Conta” com o bloco de notas com que iria autuar o
prevaricador, sendo aplaudido pelos colegas, onde se podia ver o Sabino, o
Xavier, o Mota, os irmãos Badalo, o Celestino, o Patronilha, o Ramos, a abanar
o molho de chaves que trazia na mão, o Miranda, o Nunes, o senhor João
(Meia-Lua). Por isso nesta festa de muitas gerações, só possível naquele espaço
místico, foi batido o recorde do “Um por Todos, Todos por Um”: 1/15000 avos de um copo” foi a fatura entregue
a cada camarada!
Na ala dos
“Joaninhas” podia-se ver, com a ajuda da memória coletiva, o Oliveira (Baco), o
Gunga, o Brito (Judas), o Pina Lopes, os irmãos Farinha Tavares, o Alcatrão, o
Tás-a-Ver, o Dias Antunes, o Loureiro (Clarence), o Mellow Yellow, o Xaxa, o
Mamas, o Vicú, o Tabi, o Pop, o Menau, o Ferrari, o Tadeu, o Falcão, o
Pintelheira, o Raposo, o Bozo, o Pato Marreco, o Galo, o Don-Don, o Brazão, o
Chouriço, o Fá, o Sá Dantas, o capitão Dias Antunes, o Camões, o Lufinhas, o Mexicano, o Teacher, o Cortesãoo Cuequinha, o Nogueira, o
Óscar, o Silveira, o Santola, o Dores, o capitão Oscaralhinho, que continuava
com a mania de pentear, a partir da orelha, a resma de cabelo que lhe sobrava,
e tantos outros arrumados na roda do tempo.
Após o lançamento do traidor Miguel de
Vasconcelos da varanda, deu-se início ao confronto, cujos papéis mudaram algum
tempo depois, passando todos os de baixo a ser portugueses, enquanto os de cima
se transformaram em ranhosos castelhanos, que tiveram de passar pelo meio de
duas fileiras de jovens adolescentes com as mocas nas mãos, decididos a
chicotear-lhes impiedosamente os rabos impolutos. Mas desta vez os portugueses
eram tantos, que os inimigos foram perseguidos impiedosamente até às
companhias. As marcas com que ficaram pareciam, numa primeira impressão, que os
petizes tinham sido atacados por uma praga de pulgas, mas a cor negra depressa
enfureceu as progenitoras, que tomaram de assalto o gabinete do director,
ameaçando fazer com ele e com o Pencas (354), o mesmo que os carrascos dos
filhos tinham feito ao boneco do Miguel de Vasconcelos. A lendária Mocada caiu assim
às mãos das mães, não de Bragança, mas sim dos castelhanos.
Atualmente os espanhóis continuam
ainda a passar por entre os portugueses, mas estes agora só podem bater palmas
e cantar “Minha Amora Madurinha”. Enfim, modernices!
6 comments:
Peidão, o Zé Pereira era o sucessor do Meia-Lua. O Meia-Lua era "oficialmente" o Sr. João.
E vais ter que explicar qual o papel do Pencas (Goulart) no meio desta história...
Abraço
Quanto ao Pencas pergunta ao 4 (À Nora)que me conta as aventurasda sua geração quando jogamos futebol ao domingo!
O erro em relação ao Zé Pereira e ao senhor João já foi corrigido!
E mais o Camões, o Lufinhas, o Mexicano, o Teacher, o Cortesão, etc., etc
Gordini, acrescentei os nomes!
O 274 era o balde e não o snoopy. E o Carvalho Araújo era o "Távera" ou "Tá a ver" por perguntar sempre isso no fim de cada frase.
Abraço.
Metzener
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