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315 estórias

Sunday, February 01, 2009

Estremoz cidade serena



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Comandante Guélas

Série Paço de Arcos

Uma das passagens de final do ano do Gang foi passada a quilómetros de distância, no meio de chaparros, tios chaparros, classificação que não constava nos manuais escolares dos “meninos de boas famílias” da Costa do Estoril.
- Chaparros queques?! – Perguntou admirado o Charlot.
- Tão queques que só podemos entrar de fato e gravata, e a festa é no casino lá da terra, um misto de mesas de matrecos com sofás de veludo, - explicou-lhe o Proveta, ajeitando a gravata do pai que lhe chegava aos pés!
Um dos membros do Gang namorava com uma menina cuja família tinha morada na respectiva terra e achara por bem convidar todos aqueles adolescentes das famílias mais brazonadas de Paço de Arcos, para assim subir na hierarquia social da “chaparrolândia”. Iriam todos de comboio, já equipados para a festa. A meio da viagem e já um pouco chateados por não fazerem nada, o Gang resolveu passar à acção, dando início a um jogo radical que consistia em mudar de carruagem, mas pelo lado de fora. Quando o maquinista se apercebeu do jogo, já havia vinte adolescentes, de fato e gravata, do lado de fora, facto inédito nos anais da CP alentejana. A brincadeira só acabou quando todos cumpriram o percurso definido: partida na última carruagem e meta na primeira. As autoridades da composição bem tentaram mete-los para dentro, recorrendo a gestos e a buzinadelas, mas a prova só acabou quando o Velhinho terminou o circuito. Meia-hora de descanso para os “bravos de Paço de Arcos” e nova animação: slows unisexo. O Focas e o irmão do Marreco levantaram-se e, ao som de uma música romântica, abraçaram-se e dançaram com sensualidade para a carruagem que ia atestada de velhas chaparronas tipo morcegos. Para abrilhantar o número, o Pilas foi à casa de banho e encheu de água uma camisa-de-Vénus, que pôs a circular pelos passageiros. A pouco e pouco a carruagem foi-se esvaziando de autóctones, acabando por ficar exclusiva dos “meninos de boas famílias” da Costa do Estoril. Entretanto algo parecia ter acontecido, um fenómeno do Entroncamento: o Peidão crescera durante a viagem, as mangas do blaiser castanho que o Pedro Sá lhe tinha emprestado acabavam nos cotovelos.
- Era o que eu usava quando a catequese ainda me aceitava, - explicou o proprietário, escondendo o facto de ter sido expulso da instituição aos 10 anos por ter desviado dinheiro da caixa das esmolas para ir comprar um maço de GS Filtro.
A chegada a Estremoz foi inesquecível para os habitantes. A rua principal estava recheada de laranjeiras carregadas de frutos reluzentes. Segundo reza a lenda, quem começou a guerra foi o Pilas, que acertou em cheio com uma laranja na cabeça do Conan que ripostou, mas falhou o alvo, esborrachando o esférico no fatinho catita do Velhinho, que também não gostou e respondeu à letra,…..Bastou meia-hora para a estrada principal estar pintada de cor de laranja. Mas como tinham de chegar a horas ao jantar na casa da família da namorada chaparra de um dos paço-arcoenses, sacudiram os caroços dos fatos e apresentaram-se na morada indicada. Foram recebidos como heróis e deram de caras com um repasto digno de príncipes. O Conan foi o primeiro a beijar a dona da casa e pediu para lavar as mãos. Só que não disse toda a verdade. Tinha saído de casa com a tripa cheia e durante a viagem a trepidação do comboio inibira o conteúdo de sair. Mas a “Guerra das Laranjas” acalmara-o e agora saíra tudo de uma vez. A fila para o WC aumentou, mas o Conan recusava-se a sair, puxando compulsivamente o autoclismo. Quando se viu obrigado a abandonar as instalações sanitárias, pois caso o não fizesse os colegas de escola ameaçavam deitar a porta abaixo, trouxe atrás de si um cheiro nauseabundo que não ficava nada atrás do Litopol. Devido a este “grande percalço” o jantar acabou de imediato e o Gang resolveu ir fazer uma visita de cortesia à pensão onde estavam alojados os dois únicos paço-arcoenses com posses: o Bakaus, teoricamente o maior cobridor do país, um conquistador cruel que não escolhia e atacava as suas presas sem estados de alma, e o sempre abonado com libras, o Pierre Pomme-de-Terre. Só dois tocaram à porta enquanto que os restantes permaneceram acoitados numa esquina. Uma velha estilo bruxa abriu a porta:
- Boa-tarde minha senhora, viemos dar um beijinho aos nossos manos, que estão aqui hospedados, - disse o pilas com um sorriso rasgado.
- São meninos de Lisboa?
- Sim, - respondeu o Conan, afastando com as mãos os vestígios gasosos da “obra” que tinha produzido uns quarteirões acima.
- Entrem, a casa é vossa.
Entraram todos.
- Chiça, e eu a pensar que as famílias numerosas eram aquelas que não tinham televisão, – resmungou a mulher morcego.
A contabilidade da casa era rigorosa, havia um contador à saída de cada tomada, mas o Bakaus já tinha feito uma ligação directa. O aquecedor estava ao máximo e o aparelho de controlo a dormir. Em cima de uma das mesas estava o garrafão de colónia “Lavanda” do gordo caixa-de-óculos com nome afrancesado. Quando o Gang se despediu dos “manos” o perfume transbordava dos sapatos italianos do Pierre Pomme-de-Terre. A festa decorreu sem incidentes de maior e alguns dos adolescentes acabaram a dormitar nos bancos do jardim, nunca tendo conseguido adormecer, porque a polícia colara-se ao espaço público e intervinha de cada vez que se deitavam.

4 comments:

Kruzes Kanhoto said...

Estremoz não é vila mas sim uma cidade. E já assim era na época em que supostamente terá decorrido a "estória".

António Miguel Miranda said...

Caro leitor

Tomei nota do seu comentário e já elevei Estremoz a cidade. Obrigado pelo aviso!

LM,paris said...

olà camarada Choco, pois, estou eu aqui em paris e de repente vejo que tenho um simpàtico comentàrio, merci beaucoup, c'est très gentil à vous!
Venho entao dar uma volta e zàs caio em posts onde o camarada fala de coisas e loisas onde entram gente da miha terra!
Eu sou de Lisboa, mas Paço d'Arcos é a minha terra , e Paris é a minha cidade, està a ver que rica que sou?
POis e conheço Coina!
Escrevi um poema que lhe vou enviar, se estiver bem-disposto a isso:
" as putas de Coina ".
Bom, no meu tempo os de Paço de Arcos nao eram finorios, so começavamos a ser meninos da linha a partir da Parede...mudam-se os tempos, nao me parece que conheça bem os Paçod'arcoense???
compro jà , està muito bem, nos somos pacatos, là na nossa terrinha, vamos à praia...tomamos bicas na Victoria e comemos bolas na Oceania...e vamos ao mercado ver os ultimos Mohicanos a vendrem carapau de gato ao preço do caviar, aie, aie, somos saudosistas do tempo do Bùgio, da marginal...da " voltinha dos tristes"...no domingo a Cascais, ao estoril, ao Casino, sabes camarada Choco, somos uns chatos pà!
mas boa gente, và, trate bem os meus amigos de infância, os que escaparam à guerra colonial, aos pais velhinhos, às viùvas e ataque là os Bancos que invadiram os passeios de Paço d'Arcos!!!
Vou a correr, fartei-me rir com as suas " estorias". Abraço,
LM

LM,paris said...

olà camarada Choco, pois, estou eu aqui em paris e de repente vejo que tenho um simpàtico comentàrio, merci beaucoup, c'est très gentil à vous!
Venho entao dar uma volta e zàs caio em posts onde o camarada fala de coisas e loisas onde entram gente da miha terra!
Eu sou de Lisboa, mas Paço d'Arcos é a minha terra , e Paris é a minha cidade, està a ver que rica que sou?
POis e conheço Coina!
Escrevi um poema que lhe vou enviar, se estiver bem-disposto a isso:
" as putas de Coina ".
Bom, no meu tempo os de Paço de Arcos nao eram finorios, so começavamos a ser meninos da linha a partir da Parede...mudam-se os tempos, nao me parece que conheça bem os Paçod'arcoense???
compro jà , està muito bem, nos somos pacatos, là na nossa terrinha, vamos à praia...tomamos bicas na Victoria e comemos bolas na Oceania...e vamos ao mercado ver os ultimos Mohicanos a vendrem carapau de gato ao preço do caviar, aie, aie, somos saudosistas do tempo do Bùgio, da marginal...da " voltinha dos tristes"...no domingo a Cascais, ao estoril, ao Casino, sabes camarada Choco, somos uns chatos pà!
mas boa gente, và, trate bem os meus amigos de infância, os que escaparam à guerra colonial, aos pais velhinhos, às viùvas e ataque là os Bancos que invadiram os passeios de Paço d'Arcos!!!
Vou a correr, fartei-me rir com as suas " estorias". Abraço,
LM