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315 estórias

Saturday, August 07, 2004

Desenvolvimento Pessoal e Social

                           Camarada Choco

                                             Aventura 12
 
O tema escaldava ! Pedia-se a colaboração de todos, tinha-se chegado a um ponto sem retorno, o abismo estava cada vez mais perto, a ponte para a outra cueca...perdão...para a outra margem tinha de aparecer o mais rapidamente possível. “Sexo”, sempre o maldito “sexo” ! Ficar-se-ia pela teoria, como do costume, ou tentar-se-ia socializar a prática ?
A Natureza andava a brincar connosco. Privava-nos de muitas coisas, mas no que tocava ao “chéxu” estava tudo intacto. Era só esperar pela chegada da Primavera e aí estávamos todos a abanarmo-nos de todas as formas e feitios, para chegarmos ao mesmo prazer. E quais iriam ser os temas a transmitir-nos ? Seriamos divididos por classes, os Eremitas, os Pescadores ( tudo o que vem à rede é peixe ), os Predadores, os Arrastões...etc.,etc., ou ficaria tudo ao molho ? Ou até não teríamos direito a participar, pois só aos doutores diria respeito ! Ainda as decisões não estavam tomadas e já choviam propostas:
- Os alunos da Educativa poderão ir visitar os do C.A.O. !
Uma simples visita de cortesia ou um encontro mais picante !?? E quais seriam as regras?? Existiria fora de jogo e cartão vermelho ? Quantos doutos juizes ? Não seria melhor deixar andar as coisas como estavam, do que ir mexer num vulcão meio adormecido ? A decisão estava tomada....
A sala 6 da Área Educativa, constituída por meninos e meninas no início da Puberdade tinha sido a escolhida para ir fazer uma visita sexual....perdão...perdão....uma excursão de trabalho à sala 9 da Área do C.A.O., para aí assistirem a uma Acção de Informação sobre “Sexo”. A excitação estava dentro dos parâmetros normais, incluindo duas convulsões de última hora. A saída decorreu ordeiramente ao som de um ritmo caótico e alucinante.
Na sala a Formadora esperava pacientemente os utentes, entretendo-se a desenhar num quadro um estranho objecto constituído por dois círculos pequenos e uma linha recta avantajada. Os assistentes foram-se acomodando à medida que chegavam e algum tempo depois o local já fervilhava de mongas teenagers inconsequentes.
- Bem, podemos começar – avisou a oradora, apontando para o desenho – Isto é um Pénis ! Alguém sabe o que é um Pénis ?
- Énis...Énis – levantou-se de imediato alguém da assistência com o braço no ar – Énis, Énis...
- Diz lá, Palmira Melga, o que é um Pénis.
- Énis...Énis – gritava excitada a espectadora à beira de uma convulsão, sendo acompanhada pela multidão em histerismo – Énis, Énis...
- Vá lá, explica aos teus colegas...
E como um gesto vale mais do que mil palavras, puxou de imediato o Choco que estava ao seu lado e prontificou-se para mostrar o que era o “Énis”. O macho não cabia em si de contente por ter sido ele o eleito e já deixava escapar a sua enorme língua de encontro ao chão. Abriu os braços e avançou a bacia em sinal de cooperação.
- Énis, Énis – continuava a gritar a intelectual.
Puxou pelo indicador da mão direita e colou-o de imediato nos ténis vermelhos número 50 do seu querido e respeitado Choco. A decepção foi geral, mas não evitou que a turba se lançasse furiosamente de encontro a todos os ténis presentes. O retorno à calma demorou uns longos trinta minutos, tendo sido necessário recorrer a todos os calmantes disponíveis na sala. Quanto ao macho eleito, ainda se podia ver o seu gesto reprovador, como que chamando burra à sua ilustre colega.
- Énis, Énis – gritava ininterruptamente a interveniente, alheia ao caos em que se transformara o “Desenvolvimento Pessoal e Social”.
- Quem sabe o que é um “pénis” ? – tornou a perguntar a Formadora.
De imediato, o Choco tomou a iniciativa e saltando para o palco, tal qual um felino, gritou bem alto para quem o quisesse ouvir:
- Áálho, áalho, áalho – rosnava o nosso herói do cinema mudo, ao mesmo tempo que baixava furiosamente os calções...os calções...os cinco calções multicolores que trazia desde o mês anterior.
Nem as vozes contra o demoveram da exibição e num piscar de olhos ficou com a cintura pélvica ao léu, mostrando ao público presente o apêndice avantajado, torto e com um nó na ponta com que os céus o tinham presenteado e agora aumentado com o calor da discussão. E, no meio disto tudo, ainda se ouviu um grito alucinado duma das presentes, que desmaiou com a emoção. Era a nossa querida e estimada Madame Amorim ! Quanto ao Choco, permanecia parado e orgulhoso, exibindo o seu fabuloso Chevrolet com os pneus furados, uma precaução da Natureza, não fosse ele querer seguir as pisadas dos progenitores e manter indefinidamente a inscrição da família Choco na Segurança Social.
A primeira parte da sessão estava concluída, já não havia dúvidas quanto ao “Pénis”. No entanto, foi necessário esperar algum tempo para fazer sentar a Papoila que, devido à sua fraca visão, insistia em ver o Chevrolet, tendo-se para isso deslocado para junto do colega e colado os olhos ao seu descomunal pepino. Quanto aos outros machos presentes, todos eles também exibiam os seus dotes às colegas interessadas...todos!??....todos não, havia uma excepção, o Ambrósio Caspa que, por mais que procurasse, não conseguia vislumbrar o seu cacete, ausente devido às contingências genéticas.
- Amigos, tenho outra pergunta para vos fazer – avisou a Formadora, conseguindo captar, depois de muito esforço, a pouca atenção dos presentes.
O próximo tema também não era dos mais fáceis. Foi com muito medo que se atreveu a passar à questão seguinte:
- Alguém sabe o que é uma “Vagina” ?
Foi demais ! Com esta o Choco não se aguentou e atirou-se sofregamente à Zobaida, que permanecia no seu normal estado letárgico rodeada de moscas, mas foi traído pela sua visão estereoscópica, indo cravar os dentes na roda traseira esquerda, que apresentava um piso careca, despedaçando-a com estrondo, facto este que provocou um súbito desequilíbrio na pré-histórica cadeira de rodas, que não aguentou a traição da força da Gravidade, arremessando, de imediato, o seu pesado conteúdo de encontro ao chão frio. Mas como o destino é madrasto, nesse preciso momento ia a passar a apressada Lolita que não teve outro remédio senão apanhar com os cento e tal quilos da sua colega, ficando espalmada, tendo ainda tempo de atirar umas sábias palavras para o ar:
- Organizem-se !
Foi com muito esforço que conseguiram dominar o senhor Choco, tendo o Conselho Pedagógico, que reuniu de emergência, deliberado amarrá-lo a uma cadeira. Decidiu-se também avançar com a projecção do pequeno, mas muito elucidativo, filme “A Actividade Sexual dos Caracóis, das Lentilhas e dos Percebes” da autoria do Alto Comissariado Europeu para a Igualdade no Trabalho e no Sexo ( A.C.E.I.T.S. ), que estava previsto para o final da sessão. Entretanto, os organizadores desta educativa e pedagógica Acção de Formação acharam por bem também eles recorrerem à ajuda dos milhares de drunfos postos à disposição dos presuntos....perdão...dos presentes. Pode ainda ouvir-se o protesto do Fangio Espástico, que queria que pusessem no ar a cassete com a gravação da sessão do canal 18 da TVCabo do dia anterior.
As lentilhas foram mais eficazes do que os caracóis, pois conseguiram adormecer a assistência, principalmente o impetuoso Choco que dormia agora como um anjinho, no regaço da sua amada Florbela. Quanto aos responsáveis pela organização, já estavam de novo preparados para a acção:
- Vamos falar outra vez sobre “Vagina” – principiou a titubeante Formadora, lançando um olhar medroso para as suas colegas, ao mesmo tempo que ligava o projector de slides que atirou para o écrã a imagem de uma rosa.
O tema era muito forte ! O nome da Rosa mexia demais com as profundezas da alma e das....cuecas....do nobre e altivo Choco, obrigando-o a dar um pulo majestoso, tal como um garanhão, mergulhando de cabeça no retrato...
- Ele vai dar cabo do écrã – gritou a Formadora, conseguindo afastar-se a tempo do predador.
Não se sabe a causa, nem o truque utilizado, mas todos são testemunhas juramentadas de que o herói saiu do local com uma rosa vermelha entre os dentes. Quanto à do écrã, desapareceu misteriosamente sem deixar rasto.
- Lá vão as lentilhas outra vez – gritou o projectista, rodando o manípulo do aparelho.
Ficou-se pelos bivalves e quanto aos utentes, que se desenrascassem na próxima Primavera.






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